De antemão peço perdão pelo título se você é uma pessoa chata ou se sentiu ofendido por essa constatação. Mas, de fato, apenas aqueles que já deixaram qualquer alegria pela vida guardada em uma gaveta não vão gostar do Fiat Pulse Abarth. E nem adianta reclamar que ele é um SUV e que só tem câmbio automático ou que custa R$ 149.990.
Esportivos de antigamente, altamente cultuados, como Volkswagen Gol GTI, Chevrolet Kadett GSi e Ford Escort XR3 eram igualmente caros, mas bem menos práticos. Só que eles exalavam alma esportiva e um prazer ao dirigir que só quem verdadeiramente ama carros poderia ter desenvolvido. E esse espírito está no Pulse Abarth.
Nem me venha com Powered by Abarth
Assim como seu irmão maior, o Fastback Limited Edition Powered by Abarth (e também , Renegade, Compass e Commander), o Fiat Pulse Abarth é movido por um motor 1.3 quatro cilindros turbo. É um motor um tanto quanto controverso e vítima de inúmeras reclamações de consumo excessivo de óleo – algo que a Stellantis já trabalha para resolver.
São 185 cv e 27,5 kgfm de torque, o que faz dele bem mais forte que os 150 cv do Volkswagen Polo GTS e do Renault Sandero RS, dois cultuados esportivos nacionais modernos. É o Abarth mais potente da história. Além disso, por ser o modelo mais leve da Stellantis com esse motor, o Pulse Abarth é o mais rápido.
São 7,6 segundos para chegar aos 100 km/h e velocidade máxima limitada a 215 km/h. O mais interessante do SUV esportivo é que ele parece muito melhor encaixado com esse motor do que o Fastback Limited Edition Powered by Abarth. Não somente na entrega de potência e torque, como também na dinâmica.
Veneno de escorpião
Ao apertar o botão Poison no volante, que substitui o Sport, o Pulse Abarth libera o veneno do escorpião. O acelerador fica bem mais sensível, o câmbio mais esperto e a entrega de força é mais rápida. Como resultado, ele acelera bonito e sem esforço algum, enquanto o sistema de escape exclusivo da versão esportiva ronca alto.
Por dentro do Abarth você ouve o som grave e até alguns pipocos vindos do escape. Mas quem está do lado de fora que é verdadeiramente agraciado. O ronco é grosso, encorpado, como se fosse um tenor italiano rouco. Nem parece original de fábrica: algo que a Fiat merece verdadeiro elogio.
Sua proposta mais esportiva faz com que andar lentamente no Pulse Abarth não seja algo muito comum. Tanto que durante a semana de testes com ele, foram dois tanques de etanol e mais um terço para rodar 500 km. A média foi de 8,5 km/l com bons trechos de estrada. Oficialmente ele faz, com etanol, 6,8 km/l na cidade e 8,8 km/l na estrada.
Só que, fora do modo Poison, o Pulse Abarth consegue se comportar de maneira mais comedida. Mas, ainda assim, o acelerador é sensível e o câmbio faz trocas de marcha verdadeiramente sentidas, algo que nenhum outro modelo com essa transmissão faz. Para a proposta apimentada, é um comportamento mais do que bem vindo.
Ímpeto
A direção com assistência elétrica teve sua distância batente a batente encurtada, além de ter ficado mais pesada e direta. O peso se assemelha a modelos da Volkswagen, sem aquela leveza exagerada na hora das manobras, mas ainda assim suficientemente leve para facilitar uma parada rápida em uma vaga apertada.
Em alta velocidade, o volante de aro grosso fica nitidamente pesado para ajudar a fazer curvas mais precisas, ao mesmo tempo que exige pouco curso para virar. Por ser um SUV, ele não se comporta tão bem nas curvas quanto o Polo GTS ou o Sandero RS, mas não faz feio. Ele gruda no asfalto tal qual um bambino italiano devora um cannoli.
A única questão é que a inclinação da carroceria é mais sentida por conta da suspensão elevada. Isso faz com que ele role mais em curvas e saia de frente mais fácil do que um hatch plantado no chão. A vantagem é que a suspensão não sofre nas ruas mais esburacadas que queijo suíço.
Fato que o Pulse Abarth prefere um asfalto liso, mas ele não fará sua obturação estourar ou seu ciático gritar ao passar por um buraco como outros modelos esportivos. Ele bate mais seco que o Pulse comum, mas não reclama tanto assim. Com isso, você tem um esportivo em mãos que não sacrifica a sua coluna por melhor performance em curva.
Vermelho e preto
Como todo esportivo que se preze, o Pulse Abarth também ganhou alguns truques visuais para transparecer sua esportividade. Ele segue a receita dos Abarth europeus: se livrar dos logotipos da Fiat, pintar retrovisores em vermelho com uma e faixa na lateral no mesmo tom, além de adicionar um toque a mais de esportividade.
A pestana acima dos faróis e grade ganha acabamento imitando fibra de carbono, enquanto o para-choque e os faróis vêm do Fastback. Há detalhes em vermelho na grade inferior, enquanto a superior tem treliças tipo colmeia. Na lateral, para-lamas mais largos e rodas de liga-leve de 17 polegadas que parecem pequenas para ele.
Teto com pintura contrastante ajuda a destacar ainda mais o aerofólio traseiro. O Pulse ganha também um novo para-choque traseiro com falso extrator de ar que parece de modelo de competição, além de saída dupla de escape. A carroceria pode ser nas cores preto, branco, cinza durepox e vermelho (nesse último, as faixas passam ao tom de preto).
Maldição do Pulse
Se o exterior é mais espalhafatoso, mas ainda assim bonito, a cabine preza por um lado mais sofisticado com toques de esportividade. O Abarth vem com ótimo revestimento de couro nos bancos e volante, com qualidade esperada em modelo da Jeep para cima. E isso contrasta absurdamente com a Maldição do Pulse.
Todo Fiat Pulse e todo Fastback vem com porta-luvas desalinhado. São raríssimas as unidades que não contam com esse descuido na montagem (por isso, se tiver um Pulse que esteja alinhado, aposte na Mega Sena agora). Os plásticos da cabine também variam de qualidade: a faixa cinza do painel, por exemplo, é bem oca e frágil.
Não há nenhum material macio ao toque, fora um pedaço minúsculo de couro nas portas. Os encaixes são bem feitos e os plásticos na cor preta são de qualiade. Na versão Abarth, o Pulse herdou o console central elevado do Fastback. Com isso, ganhou porta-copos removível, freio de estacionamento eletrônico e carregador de celular por indução com saída de ar dedicada para não deixar o smartphone quente demais.
Apesar de a Fiat negar com todos os pés juntos que o Pulse é derivado do Argo (mesmo ele sendo) a marca trouxe de volta o volante antigo do hatch compacto para a versão esportiva do SUV. É um item que destoa bastante do visual esportivo e refinado do Abarth. Até porque esse volante nunca foi bonito.
Boas heranças
Há de destacar ainda o painel de instrumentos totalmente digital com recursos extras no Abarth, como medidor de força G, gráfico de potência e pressão do turbo. Ele conta com outros recursos e personalização que são bem interessantes, além da tela de ótima qualidade.
A central multimídia vai na mesma tocada, com tela de definição ótima, fácil de mexer, com bom tamanho e posicionada no alto. Traz Android Auto e Apple CarPlay sem fio, além da possibilidade de controlar diversos aspecto do carro – inclusive o ar-condicionado, ainda que este tenha botões físicos no console e que são muito mais úteis.
Espaço interno é um ponto conturbado. Afinal, o Pulse não é dos mais espaçosos em sua categoria. Quem senta atrás fica levemente espremido, especialmente porque os bancos dianteiros são grossos, mas não receberam mudanças para a versão esportiva (uma pena). Porta-malas de 370 litros é apenas dentro da média, mas tem acesso difícil por ser fundo.
Padrão do andar de entrada
Mesmo sendo a versão de topo do Fiat Pulse, o Abarth ainda não é totalmente equipado com sistemas avançados de segurança como piloto automático adaptativo. Ainda assim, traz itens como sistema de manutenção em faixa (exagerado em sua atuação), frenagem autônoma de emergência e farol alto automático.
O modelo conta ainda com controle de tração e estabilidade (bastante permissivos no modo Poison), assistente de partida em rampa, chave presencial, faróis full-LED, câmera de ré, sensor de estacionamento dianteiro e traseiro, vetorização de torque, volante com ajuste de altura e profundidade e ar-condicionado digital de uma zona.
Por fim, traz como itens de série vidros elétricos nas quatro portas, retrovisores elétricos com rebatimento automático, auto hold, piloto automático, trocas de marcha no volante, retrovisor eletrocrômico, partida remota, wi-fi, assistente de partida em rampa e saída de ar para o banco traseiro.
Veredicto
Quando olharmos no futuro com carinho para os tempos de hoje, Renault Sandero RS, Volkswagen Polo GTS e agora o Fiat Pulse Abarth terão o mesmo impacto de Gol GTI, Kadett GSi e Escort XR3. Pode me cobrar daqui há 30 anos, por mais que agora discorde por ele ser um SUV e moderno.
O fato é que o Pulse Abarth vai um pouco além. Por ser um SUV, está na categoria da moda, mas também entrega uma suspensão verdadeiramente esportiva, sem que te exija passar por um quiropata a cada volta na quadra. Além disso, por mais que o câmbio manual seja divertido, até os mais puristas já sabem apreciar um câmbio automático.
Ou seja, mesmo com defeitos como a típica maldição do Pulse, óleo baixando no motor e preço elevado para seu porte, o Abarth compensa tudo isso com uma dinâmica apurada, um ronco excepcional e, o mais importante, com alma: algo que falta a muitos carros de hoje em dia. Ironicamente, uma ausência que o próprio Pulse tem nas versões normais.
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