Desde que o Fiat Palio nos deixou aqui no Brasil junto ao Punto e Bravo, o Argo assumiu o papel do trio em uma tacada só. Sozinho, tem de enfrentar o mercado de populares, compactos premium e o topo da categoria que já invadiu o público que antes comprava hatches médios.
Mas se antes a Fiat era conhecida por ser uma marca boa de fazer carros baratos, como era o caso do Palio, o Argo honra seu legado? Para saber até onde isso é verdade ou não, testamos a versão de entrada sem nome com motor 1.0 de R$ 56.590 (R$ 57.539 no estado de São Paulo) para comprovar.
Voto franciscano
Foi-se o tempo em que os carros de entrada não possuíam ao menos o kit dignidade (ar-condicionado, direção assistida e vidros elétricos). O Argo 1.0 sem nome já traz esse pacote na lista de item de série e agrega ainda alarme, travas elétricas, chave canivete e volante com ajuste de altura.
O pecado da versão de entrada do Argo é não oferecer sequer um rádio simples. Para ter algum tipo de comodidade auditiva nele é preciso comprar o Kit Plus de R$ 1.070 que adiciona limpar e desembaçador traseiro além de preparação para som.
Com isso, o Argo testado não saia por menos de R$ 57.660 (R$ 58.627 no estado de São Paulo), já que a pintura preta não é cobrada. Vale ressaltar que essa versão tem menos opções de cores que as demais, sendo restrita a preto, vermelho, branco, prata e cinza.
Só o kit necessário para instalação de um rádio, não o aparelho em si, infelizmente. Na semana que passei com esse Argo tive de apelar para um método nada convencional de usar o celular no console central como um rádio – fica a curiosidade dos bastidores.
A lista de equipamentos é bem parecida com a do Hyundai HB20 Sense recentemente avaliado pelo Auto+. Ainda que o Argo fique devendo itens que o HB20 com pacote tem, além de ser mais caro.
Impressão acima
Uma das vantagens que o Argo sem nome tem em relação aos rivais é que como ele foi pensado para suprir até o público do Bravo, a Fiat caprichou no interior. Ainda que a ausência de rádio seja o ponto mais notável, ele não parece um carro básico demais. O painel é dominado pela cor preta, mas existem diversas texturas criando contrastes interessantes.
O volante tem ótima empunhadura, é mais grosso que a média e tem material agradável ao toque, mesmo não tendo couro. Destaque para os comandos do lado esquerdo, que estão ali para comandar o ótimo computador de bordo do Argo.
Emborrachados, os comandos do ar-condicionado parecem feitos para um carro mais caro do que de fato o Argo é. Tudo fica fácil e à mão, mas a ergonomia derrapa feio em um ponto: a posição de dirigir. Por não ter ajuste de profundidade, o volante ficou demasiadamente próximo ao painel.
Ao mesmo tempo, o banco do motorista é posicionado mais alto do que o necessário e não há ajuste para essa região. Com isso, quem pilota o Argo precisa esticar demais os braços e as pernas, além de ficar sem muito espaço para a cabeça – especialmente se for uma pessoa alta.
Lá atrás, em compensação, o hatch compacto da Fiat entrega espaço de sobra. É uma das referências na categoria junto ao Renault Sandero. Bônus para o vidro que desce totalmente, ainda que seja operado por manivelas – as janelas dianteiras tem acionamento elétrico com função um toque.
Com 300 litros de porta-malas, o Argo entrega espaço suficiente para as famílias, mas carece de mais cuidado por ali, O carpete usado é simples e não há luz. Ao menos o porta-malas pode ser aberto pela chave ou por um prático botão na parte inferior.
Mito dos 1.0
Se antigamente ter um hatch compacto 1.0, ainda mais com as dimensões generosas do Argo, parecia um pesadelo, hoje a história é mais tranquila. O Fiat Argo é equipado com motor 1.0 Firefly três cilindros aspirado de 72 cv e 10,9 kgfm de torque. É potência inferior aos rivais, mas torque bastante semelhante.
No dia-a-dia ele vai muito bem. O acelerador é sensível até demais, fazendo com que o tricilíndrico entregue toda a sua força em boa parte do tempo. Isso reduz a sensação de que falta força – até que uma subida chegue e seja necessária uma redução. Contudo, o torque é suficiente para as situações urbanas mais comuns, mesmo com alguns passageiros dentro.
É nítida a vibração do motor 1.0 quando o Argo está parado, sendo mais sentida que em rivais próximos. Além disso, o motor tem funcionamento levemente áspero, mas entrega um ronco interessante. Os números de consumo são apenas ok, com médias de 10 km/l na cidade e 12,5 km/l na estrada com etanol durante nossos testes.
O problema do consumo em estrada é atribuído ao câmbio. A transmissão manual de cinco marchas tem relações muito curtas, fazendo com que pouco além de 50 km/h o Argo já chame a quinta marcha. Na estrada, ele fica em 3.500 giros a 100 km/h e passa dos 4 mil a 120 km/h.
Isso não se traduz em ruído interno pois o isolamento acústico do Argo é bom, mas a rotação alta penaliza o consumo. Com bom torque em baixa, o motor poderia ser melhor explorado com uma sexta marcha, que não deixaria o Argo sem fôlego na estrada em uma rotação mais baixa.
Outro elemento a ser pontuado é o quão longos os engates são, além de imprecisos e borrachudos. A transmissão da Fiat melhorou com o tempo, mas ainda parece ser exatamente a mesma que o Palio usava em 1996, a qual continha os mesmos problemas. A manopla alta também não ajuda nessa sensação.
Cuidado extra
Um dos pontos em que seus antecessores Punto e Bravo sempre foram elogiados era na dinâmica e o Argo honra esse legado. A suspensão é o maior mérito do hatch compacto italiano. Ela lida muito bem com as imperfeições do solo e não é barulhenta como a do Chevrolet Onix. Ainda que seja mais firme do que o típico , ele puxa mais para o conforto.
Só não dá para dizer que a versão sem nome tem apetite por curvas pois seus pneus 174/65 R14 tem a tendência de cantar mais alto nas curvas que candidatos em show de calouros. A direção pende para o lado do conforto, com assistência elétrica bem leve na cidade, mas confortável na estrada.
O Argo 1.0 demonstra nitidamente que foi pensado para motores maiores e tem potencial para mais. Pelo conjunto da obra, fica evidente que ele será muito bem recebido pelo novo motor 1.0 Firefly turbo. Motor que, vale lembrar, finalmente substituirá o jurássico 1.8 E.Torq usado nas versões mais caras. A julgar pelo desempenho do aspirado, há muito potencial.
Veredicto
O Fiat Argo 1.0 definitivamente honra o legado do Palio ao apresentar uma boa fórmula para o mercado de entrada. Ao mesmo tempo em que supre o público do Punto que buscava um hatch compacto mais sofisticado que os demais. Do lado do Bravo, ele tem a vantagem de ser mais espaçoso por dentro.
Por quase R$ 60 mil ele é um dos hatches compactos de entrada mais baratos do mercado e isso fica nítido na lista de equipamentos. Mas entrega um bom conjunto motor, interior caprichado e visual ainda atraente e que se passa fácil por uma versão mais cara.
Mas, nessa faixa de preço, o Hyundai HB20 Sense é uma alternativa que muito deve ser considerada.
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