Honrar legados não é para qualquer um, ainda mais no mundo automotivo. O Volkswagen Gol conseguiu fazer isso quando substituiu o Fusca. O Fiat Argo tenta até hoje chegar no lugar que o Palio conquistou. Já o Chevrolet Onix não somente superou o legado deixado pelo Corsa como criou o seu. Seria então o novo Peugeot 208 aquele que finalmente trará a marca de volta aos tempos do 206?
Mais do que isso: o Peugeot 208 de segunda geração é finalmente a revolução que a PSA precisa e promete? Ao menos em questão de expectativa é possível dizer que nunca um carro francês na história do Brasil foi tão esperado quanto ele.
Se expectativa se cumpre ou não é o que descobriremos no teste com a versão topo de linha Griffe tabelada em salgados R$ 94.990. Valor que só não o torna o hatch compacto mais caro do Brasil por causa do VW Polo GTS. Só que, por meio de descontos diretos da Peugeot, ele já é encontrado por R$ 89.990.
Padrão europeu
Existe um local no qual o Peugeot 208 é verdadeiramente um ponto muito fora da curva de outros compactos: o interior. A cabine tem acabamento excelente, visual de carro conceito e muita tecnologia. É um jeito da marca francesa tentar justificar o preço alto.
As versões mais caras do novo 208 trazem faixa macia ao toque imitando fibra de carbono. Os plásticos usados são de ótima qualidade. Essa sensação de refinamento é auxiliada pelos bancos revestidos em couro, Alcântara e tecido – layout usado em carros premium.
Com o novo 208, a Peugeot quer colocar seu posicionamento global aqui no Brasil. Ela quer ficar um patamar acima das marcas generalistas, mas um abaixo das premium. Bastante parecido com o que o posicionamento da Jeep. E o 208 consegue transmitir isso.
Outro ponto em que ele se destaca é na lista de itens de série que conta com sistema de manutenção em faixa com correção de volante, leitor de placas de trânsito, frenagem autônoma de emergência, faróis full-LED com assistente de luz alta e acendimento automático, chave presencial por aproximação, além de câmera e sensor de ré.
Só quem viveu sabe
As melhores fotografias e vídeos não são capazes de reproduzir de verdade o efeito 3D do painel de instrumentos do 208. Ele tem realmente sensação de profundidade como um painel tradicional. É vistoso, com boa quantidade de informações e tela rápida.
Entre os painéis de instrumentos digitais atualmente presentes no mercado, o da Peugeot está entre os melhores – mesmo quando marcas premium entram na jogada. Posicionado no alto, o painel deve ser enxergado por cima do volante, não entre ele como nos carros tradicionais.
Isso se traduz em um volante menor, achatado, esportivo e com bom revestimento de couro. A pegada é excelente, instigando uma condução mais animada. Requer costume e nem todos conseguirão se adaptar, vale ressaltar.
Fazendo par ao painel está a central multimídia com Android Auto e Apple CarPlay. Ela tem definição boa e tamanho dentro da média. Há uma película acetinada que evita marcas de dedos ou reflexos, mas que tira um pouco da qualidade do display.
Ela tem funcionamento rápido e utilização bastante intuitiva. O pênalti vai para o ar-condicionado digital, presente em menu da central multimídia e que exige sair do Android Auto ou Apple CarPlay para ser operado.
Não há um botão para retornar à função anterior rapidamente – ao contrário do ar-condicionado que tem três teclas dedicadas a ele no console. Como os concorrentes, tem apenas uma zona, mas traz três práticos modos de atuação da ventilação.
Heranças e perseveranças
Da primeira geração do Peugeot 208, o novo modelo herdou a posição baixa de dirigir, mas que permite uma boa quantidade de ajustes. Volante regula em altura e profundidade em uma escala larga, assim como o banco – layout que permite a todos os tipos de motorista dirigir o 208 com conforto.
O problema é o espaço traseiro. É o hatch mais espaçoso da história dos Peugeot família 200 e alguma coisa, mas ainda assim é apertado. O espaço para a cabeça fica justo para pessoas mais altas. Ao menos o belíssimo teto panorâmico diminui a sensação de claustrofobia. E o 208 herdou lá do 206 as hastes de comando e do piloto automático.
Outro ponto que 206 e 208 têm em comum é a incrível habilidade de fazer pescoços virarem na rua. Seu avô 206, lançado no finalzinho dos anos 1990, era um refresco no mercado com seu design ousado e chamativo. Ele deve estar orgulhoso do neto.
O novo 208 traz o mesmo efeito, em especial por conta dos belíssimos LEDs diurnos em forma de dentes de leão. A grade frontal cromada e larga ajuda nesse efeito. Já na traseira, as lanternas conectadas por uma barra preta fazem um aceno ao 3008, SUV da Peugeot sempre elogiado pelo visual.
Suficientemente suficiente
Quando a Peugeot anunciou que a nova geração do 208 não seria equipada com o tão desejado motor 1.2 três cilindros turbo no Brasil, foi um grande balde de água fria. Afinal, os reis do segmento, Chevrolet Onix e Hyundai HB20, além do VW Polo que é referência, são todos turbo.
A marca ainda trouxe menos esperança a todos quando anunciou que ele manteria o 1.6 quatro cilindros aspirado de 118 cv e 15,2 kgfm de torque que tem muita semelhança com o motor que o 206 usava.
Se na ficha técnica ele não empolga, na prática, no entanto, a coisa muda. O Peugeot 208 não tem aquele soco e agilidade dos motores três cilindros turbo, mas é suficiente para ele. Não é um carro manco e não parece faltar potência, mesmo em retomadas.
Admito que queria um turbo debaixo do capô, mas me surpreendeu ao ver que o 1.6 era suficientemente suficiente para ele. Tal qual outros modelos da PSA, um dos grandes trunfos do 208 é o excelente câmbio automático de seis marchas.
Ele sabe muito bem como extrair o melhor do propulsor aspirado. Trabalha com suavidade nas trocas, sendo praticamente imperceptíveis. Mas o grande destaque é que ele evita reduções desnecessárias típicas de câmbios automáticos desesperados, como de alguns rivais.
Em um carro manual na estrada, você às vezes pode pisar um pouco mais no acelerador só para ganhar mais velocidade, sem necessariamente reduzir uma marcha. O 208 entende isso e não joga para quarta ou quinta como seus concorrentes diretos fazem.
Como resultado, o modelo marcou 17,5 km/l em nossos testes nas rodovias com gasolina andando no limite da via. A 120 km/h ele marcava constantes 3 mil rpm, enquanto a 100 km/h o conta-giros digital trava em 2.500 rpm.
É ok para um modelo de seis marchas, mas o isolamento acústico excelente no interior permite que o silêncio a bordo permaneça.
Potencial para mais
A plataforma modular CMP do novo Peugeot 208 provou ser capaz de mais. O hatch compacto tem tempero esportivo na condução, com carroceria bastante sólida e estável nas curvas. Definitivamente, o francês tem apetite para mais e para uma potencial versão esportiva de fato. Será pedir muito ainda desejar o 208 1.2 THP? Ou com motor Firefly turbo da Fiat?
Junte a isso o já mencionado volante pequeno com a assistência elétrica da direção calibrada na medida. Ela é leve nas manobras e em circuitos urbanos, enquanto na estrada é dura como uma pedra.
Do mesmo modo, a suspensão é mais firminha, puxando para o legado dos hot hatches franceses, mas sem passar perto de ser desconfortável. Ela absorve muito bem os buracos com trabalho competente da suspensão que não bate seco ou é ruidosa.
Veredicto
O Peugeot 208 Griffe custa mais caro do que deveria e não tem motor turbo como o esperado. Mas ele é aquele tipo de carro que verdadeiramente é compreendido quando usado. O motor 1.6 da conta suficientemente do recado e o preço alto é justificado por uma lista de itens de série e acabamento que os rivais passam muito longe de ter.
Nesse sentido, é inegável que o Peugeot 208 honra o legado do 206, apaga o estrago feito pelo 207 e finalmente coloca um holofote sobre o nome 208, o qual seu antecessor nunca conseguiu. É um novo nível de hatch compacto e que pode finalmente tirar a do ostracismo.
Portanto, basta vencer o infundado preconceito com carros franceses e que a má impressão inicial da falta do motor turbo seja perdoada.
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