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Automobilismo

10 anos do maior escândalo da história da F-1

 Um acidente proposital pra garantir a vitória do companheiro de equipe: foi em setembro de 2008 que o mundo viu um dos maiores golpes do esporte

Carro de Nelsinho Piquet no momento do acidente (divulgação/Sutton)
Carro de Nelsinho Piquet no momento do acidente (divulgação/Sutton)

Você provavelmente se lembra do Grande Prêmio de Singapura de Fórmula 1 em 2008. Felipe Massa parou nos boxes e um dos mecânicos cometeu um errinho bobo: pressionou, de leve, a luz verde de sinalização, que autorizava Massa a voltar pra pista.

Só que o reabastecimento ainda não havia sido concluído e o piloto brasileiro saiu arrancando a mangueira de combustível, presa ao carro da Ferrari. Federico Uguzzoni, o mecânico que fez essa bobagem, caiu em um choro incontrolável, certo de que havia sido o grande vilão do dia. Pobre Federico.

Massa saindo dos boxes após erro do mecânico (divulgação/Sutton)

O que nem ele, nem nós sabíamos era que o destino daquela prova de F-1 já estava traçado e não passava pelas mãos dele, nem de Massa. O vilão era outro, também italiano, mas que vivia longe dos boxes da Ferrari. Atendia pelo nome de Flavio Briatore.

Chefe de equipe vitorioso, Briatore comandou algumas das melhores estruturas e alguns dos pilotos mais talentosos de todos os tempos, como a Benetton de Michael Schumacher, campeã em 1994 e 1995, e a Renault de Fernando Alonso, em 2005 e 2006. Por trás do jeitão de mafioso italiano, tinha também um lado folclórico, do tipo que gosta de levar vantagem.

Foram muitas as suspeitas em torno de irregularidades nos carros de Briatore desde a chegada dele à Fórmula 1. Mas como elas não se confirmavam, ficava tudo meio na ‘lei do mais esperto’. Foi com essa sensação – de estar acima de tudo e de todos – que ele arquitetou um dos maiores golpes da história da categoria. No melhor estilo ‘Onze Homens e um Segredo’.

Na corrida de Singapura de 2008, Nelsinho Piquet teria de bater de propósito, em um ponto determinado do circuito, onde o resgate teria trabalho para retirar o carro dele. Isso provocaria a intervenção do safety car, o que seria extremamente benéfico para Fernando Alonso, o companheiro de equipe dele.

Como? A gente explica.

Alonso já teria parado para reabastecimento e troca de pneus quando isso tudo acontecesse; e poderia tomar a liderança assim que os outros parassem, já que o safety car iria aniquilar a desvantagem que teria em relação aos adversários (isso havia acontecido de forma natural com o próprio Nelsinho meses antes, na prova da Alemanha).

Dito e feito.

Os caras foram parando (inclusive Massa, naquele episódio da mangueira), Alonso foi subindo e assumiu a ponta. Teria de fazer outro pit stop, numa estratégia suspeita de duas paradas, mas ainda assim voltaria à frente. E ganhou a prova! Segundo ele mesmo, tudo na base da estratégia e da sorte. Mas sabemos que não foi bem assim.

Um ano depois, a FIA (Federação Internacional de Automobilismo) recebeu uma denúncia do próprio pai de Nelsinho, o tricampeão mundial Nelson Piquet, e abriu uma investigação em torno do acidente, que havia sido premeditado.

Nelsinho Piquet havia sido demitido por Flavio Briatore semanas antes (por mau desempenho). A demissão foi uma tremenda burrada de Briatore, já que o garoto saía de lá com explosivos amarrados na cintura, podendo detonar a qualquer momento, como fez.

Nelson pai soube da história dois dias depois do ocorrido – ainda em 2008 – e por meses tentou convencer Nelsinho a revelar tudo. Depois de demitido, já sem ligação com a equipe, Nelsinho finalmente estava livre para falar e testemunhou contra Flavio Briatore e o engenheiro Pat Symonds no tribunal da FIA.

Briatore foi suspenso de eventos sancionados pela FIA por toda a vida e Symonds, por cinco anos. Ambos recorreram às instâncias superiores e conseguiram – acredite se quiser – anular as penas. Já podem ser vistos normalmente no paddock.

Nelsinho Piquet não foi punido. Foi uma das primeiras aparições da expressão que se tornaria comum por aqui alguns anos mais tarde: a chamada ‘delação premiada’. Contou tudo em troca do benefício de seguir exercendo sua profissão normalmente. E digamos que ele se reergueu muito bem do escândalo. Em 2015, foi o campeão da Fórmula E, a categoria de carros elétricos promovida pela FIA.

Fernando Alonso comemorando a vitória no GP de Singapura (divulgação/Sutton)

Fernando Alonso também foi absolvido nesse rolo todo, embora houvesse suspeitas de que ele sabia da armação. Pra se ter uma ideia, semanas depois do escândalo, ainda em meio às investigações, Alonso voltou a Singapura para a corrida de 2009 e foi o terceiro colocado. Suas primeiras palavras depois do pódio foram para mostrar suporte e dedicar o resultado a Flavio Briatore. Na maior cara de pau.

É que Alonso tem com Briatore uma dívida de gratidão: foi o chefe de equipe italiano quem o ‘descobriu’ e quem abriu as portas da Fórmula 1 para o piloto espanhol.

Curiosidade. Não tinha muito tempo, o próprio Alonso havia detonado um escândalo na Fórmula 1. Em meados de 2007, pê da vida com a McLaren, onde estava sofrendo nas mãos do chefe de equipe Ron Dennis e do novato Lewis Hamilton, Alonso forneceu à FIA evidências de que a McLaren estava se beneficiando de um esquema de espionagem pra cima da Ferrari.

A equipe foi multada em 100 milhões de dólares e excluída da classificação de Construtores daquele ano. Alonso aproveitou e se mandou para a Renault, onde faria parte do esquema de Briatore.

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